13 de dezembro de 2011

XIV FESTAC




Respeitável público...

A Cia. Héterus esteve, no dia 05 de Dezembro, em apresentação no Teatro do Kaos com o espetáculo
"Oedipus Rex".
Fomos muito bem recebidos por toda comissão organizadora do Festival. Foi uma noite agradabilíssima em que pudemos, não somente apresentar um belíssimo trabalho, como receber ótimas considerações do público e dos orientadores presntes (Bri Fiocca, Cássia Guindo e Luiz Amorim).
Agradecemos a todos que nos auxiliaram nessa e em outras apresentações (não mencionarei nomes para não cometer injustiças e/ou esquecimentos).



Aproveito e indico a todos a gravação e edição feita por Sander Newton do espetáculo disponível no link abaixo.

http://www.youtube.com/watch?v=LhS0yJdZfNU

E que sigamos o tema desse festival onde "O espetáculo não pode parar"!!!



"A criação é ,antes de mais nada, a plena concentração de toda a natureza espiritual e física."
Constantin Stanislavski

Arthur Decide Viver






A montagem da cena segue o texto criado pelo escritor e dramaturgo vicentino Jobson Ricciardi, feita pela Cia Héterus de Teatro e sob direção do próprio autor em companhia com o ator e diretor teatral Rodrigo Caesar. A cena aplica tons realistas e absurdos ao abordar

o encontro incomum e inesperado de Arthur com a morte.

A vida cotidiana e sem graça dele é conflitada quando ele se vê diante da aparição mística e atemporal, gerando um questionamento existencial.

Executando uma série de hábitos monótonos e repetitivos, Arthu

r recebe repentinamente a visita da morte em seu apartamento. O encontro desencadeia um diálogo reflexivo e cômico.

A Cena obteve quatro prêmios no XV FESCETE: Melhor sonolastia (Jobson ricciardi), Melhor Texto Original (Jobson ricciardi), Melhor Ator (Lucas Magalhães) e Melhor cena da categoria adulto.





A Cia. Héterus

A Cia héterus de teatro, nasceu na cidade de São Vicente, no ano de 2007. Surgiu, inicialmente, da vontade de quatro artistas: Rodrigo Caesar, Romulo Crescente, Gustavo Roemer e Diego Spósito, de desenvolver um trabalho profissional na área da comédia. Após quatro anos de trabalho com o espetáculo cômico “O famoso Quem”, de autoria de Romulo Crescente e Diego Spósito, a Cia partiu para um trabalho dramático, desafiando a linguagem da tragédia grega e remontando o espetáculo Édipo Rei.

A Cia. Héterus de Teatro participou do XV Festival de Cenas teatrais do Tescom (FESCETE), com a cena “Arthur decide Viver”, de autoria de Jobson Ricciardi (também integrante do grupo) e com o elenco integrado por Carol Rainho e Lucas Magalhães. A Cena obteve quatro prêmios: Melhor sonolastia (Jobson ricciardi), Melhor Texto Original (Jobson ricciardi), Melhor Ator (Lucas Magalhães) e Melhor cena da categoria adulto.

Atualmente a Cia Héterus, que ganhou o Mapa Cultural Paulista de 2011 – fase regional – e segue para a fase Estadual com esse espetáculo, pretende se aprofundar no estudo de grandes clássicos do teatro com nova roupagem, assumindo a necessidade de estudar novas linguagens e formas para a encenação teatral.

O GESTO, O GESTUAL, O GESTUALIZÁVEL... EXPERIÊNCIAS ESTÉTICO-SOCIAIS

por Alexandre Mate

(professor do Instituto de Artes da Unesp, pesquisador e militante do teatro de rua).

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica
.

A procura da poesia,
Carlos Drummond de Andrade.

Referindo-se ao prédio articulado à linguagem estética, teatro significa lugar de onde se vê, miradouro. Primordialmente, quando o teatro foi batizado com este nome (Antiguidade clássica grega), o objetivo do Estado, ao criar o espaço e ao definir o que deveria ser escrito (os textos teatrais participavam de festivais), centrava-se, sobretudo, na composição de assunto, cuja história oficial precisava ser preservada. Assim, pode-se afirmar, a despeito da qualidade das obras do período que chegaram até nós, que o teatro se caracterizaria, também, em um miradouro de preservação da história oficial.

Expulsos da ágora, e proibidos de apresentar suas obras nos espaços oficiais, tanto por sua irreverência quanto pelos seus “textos” (ou por aquilo que diziam) não se alinhar à história oficial, os artistas populares encontraram na deambulação e na errância o único modo de conseguirem sobreviver e de se dedicar à sua arte. Os gregos não documentaram a produção popular, entretanto, e na medida em que houve muito trânsito entre gregos e romanos, a produção dos últimos serve de baliza e referencia ao que se produziu na Grécia. Os chamados flíacos ou mimos faziam comédia irreverente, rindo de modo iconoclasta (destruidor dos mitos e da história oficial) e, principalmente, dos mandantes do poder da vez.

De origem latina, espetáculo significa o que chama atenção, atrai e prende o olhar; assim, essa ação ocorre apenas quando o espectador assiste a obra, pressupondo, portanto, relação, troca. O espetáculo é um fenômeno estético-social cuja tríade essencial compreende: ator, público e texto.

Durante o espetáculo, ator e público promovem uma relação fundamentada em jogo de decifração de símbolos, tanto enigmáticos (mais difíceis de serem traduzidos) e de alegorias (símbolos facilmente traduzíveis). A troca entre ambos (atores e público) ocorre quando o texto que intermedia essa relação, na condição de um “tecido simbólico”, transforma-se em gesto. Na condição de uma fratura do cotidiano, o espetáculo, que acontece no tempo e no espaço, compreende um grande arcabouço de gestualização estético-social. O gestual passa pelo corpo do ator que, na condição de ser social, irradia complexa e múltipla gama simbológica. O poeta francês Charles Baudelaire afirma, em um de seus textos, que a arte é uma “floresta de símbolos”, e que toda floresta é inexpugnável (na condição de organismo vivo e premida por mistérios ela não se dá a conhecer...).

Normalmente, em nosso cotidiano, não prestamos tanta atenção aos gestos que fazemos, mas todo ser social incorpora ao seu corpo atitudes gestualizáveis herdadas do contexto histórico-social com a incumbência de provocar, de emocionar, de estupidificar, de enviar sinais, de promover uma troca... Nas artes da representação, o corpo potencializa sua capacidade expressiva, redimensionando-se a partir de gestualização totalmente elaborada. Dentre gama infinda, e em acordo com o gênero e a recepção, tudo, na condição de índice, passa a ser passível de ser interpretado... Aliás, a palavra intérprete e interpretação têm a junção (do latim) de inter (entre) + pretium (preço) = portanto, espécie de corretor, aquele que trata e atribui um preço, um valor a... claro, o conceito ganha, ao longo da história outras conotações...

O gesto corresponde a uma determinada atitude do corpo (que incorpora as determinações histórico-sociais, em seu sentido estrito e restrito). A literatura teatral, cuja essência pressupõe a organização de linguagem mediada por palavras escritas, em teatro, efetiva-se por meio de símbolos sonoros e duplamente gestuais (intenção por meio da qual a palavra se projeta) e atitude do corpo; então, o texto falado corresponde a uma linguagem corpóreo-sonora, cuja existência é traduzida gestualmente.

“Vestido” ou não com a personagem, de modo a reproduzi-la critica ou a decalcá-la verossimilhantemente (colocar-se em situação, como se fosse a personagem, apresentar uma cópia muito e tão próxima do original), o teatro é um jogo, fundamentado no ludibrio por meio do qual se pode enganar ou explicitar as regras e evidências ao espectador: tudo depende da parceria que se queira estabelecer. De qualquer modo, Bertolt Brecht afirma ser preciso mostrar a personagem, na condição de um experimento de natureza social! Ainda para o pensador e dramaturgo alemão, a exteriorização do gesto é, na maior parte das vezes, contraditória e complexa e dificilmente transmitida por uma única palavra. Insiste em que é salutaríssimo desconfiar de tudo o que pensamos e fazemos...

Em português, a manifestação corporal apreensível e materializada pela fala; pelo movimento em si e no espaço (sentido estrito e restrito); por índices visuais (tatuagens...) é apresentada por uma única palavra. Em alemão, a múltipla e complexa atitude do ser social tornar-se um tecido simbólico é apresentada pelas palavras-conceito: gestisch corresponde a linguagem gestual; gesten corresponde a conjunto de manifestações corporais (um dançarino, uma multidão); gestikulieren corresponde aos gestos que acompanham a fala, quase sem intenção fática, espécie de movimento reflexo; gestik corresponde aos gestos que acompanham a fala ou não, com função fática, expressiva (alegorias).

Por conta de Bertolt Brecht fazer thäeter (linguagem artística contrária ao, por ele chamado, teatro culinário), o gesto social caracteriza-se no atributo social e no conceito central de sua estética. Desse modo, ao refuncionalizar a palavra latina gestus, e por estar convencido de que por meio do gesto o ator, por inteiro se faria social, Brecht cria um teatro épicodialético, também, na dimensão gestual. Gerd Bornheim (Brecht: a estética do teatro. RJ: Graal, 1992, p.281) afirma que gestus pressupõe: “[...] a expressão mímica e gestual das relações sociais, nas quais os homens de uma determinada época se relacionam.” Fredric Jamerson afirma, com relação ao conceito ser importante destacar que no trabalho do ator o gestus corresponde ao resultado de um infindável exercício e experimentação de múltiplas hesitações até uma escolha do modo de mostrá-lo. Assim, em O método Brecht (Petrópolis: Vozes, 1999, p.110): “Não é exatamente indecibilidade esta hesitação interpretativa: ela não resvala para o informe; por outro lado, ela incita o espectador a reelaborar seus pensamentos e testá-los contra o evento inicial ou o acontecimento que lhes serviu de pretexto.” Ainda com Jameson, depois de substancial reflexão acerca da etimologia e do conceito de gestus, o conceito assim aparece, à p.139:

[...] gestus é o operador de um efeito de estranhamento no sentido próprio; e em particular que o estranhamento deriva da superposição de cada um destes significados sobre os demais, mostrando-nos, por exemplo, como um movimento involuntário de mão poderia, em certas circunstâncias [...] contar como um fatídico ato histórico, com conseqüências sérias e irreversíveis. [...] é uma superposição e um estranhamento que não apenas nos faz entender o elemento narrativo específico a uma luz nova e transformadora, mas também muda nossas ideias sobre o que é um simples gesto físico e sobre o que ao mesmo tempo conta como um acontecimento histórico.

Para finalizar, na dimensão épicodialética, o gestus, ao dividir a apreensão do espectador, provoca um conjunto de reflexões. Vê-se algo que, ao expressar variadas e contraditórias conotações, induz ao cotejamento, à contraposição de leituras. O espectador afasta-se do que vê para aproximar-se da vida que vive e, a partir daí, voltar à obra. Em movimento dialético, pode-se ver além do aparentemente apreensível.

Extraido de
A Gargalhada.
Uma Publicação do Buraco d`Oráculo
com distribuição Gratuita – Nº 21 – Abr/Mai.2011
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